domingo, 18 de janeiro de 2009

A Escola não pode fazer tudo sozinha

Actualidade



2009.01.15



A escola não pode fazer tudo sozinha






'A escola não pode fazer tudo sozinha'
Sara R. Oliveira| 2009-01-14
in educare.pt

Fernando Lima, professor de História, analisou fragilidades e potencialidades do movimento associativo de pais. Na sua tese de doutoramento, concluiu que a intervenção das associações é mais consentida do que reconhecida.
'O movimento associativo de pais e a construção da escola pública' é o nome da tese de doutoramento de Fernando Lima, professor de História da EB 2,3 da Corga de Lobão, em Santa Maria da Feira. O trabalho académico resulta de cinco anos de investigação e foi apresentado na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação do Porto em Dezembro de 2008. O docente conclui que os pais querem participar mais na vida das escolas, que 'alimentam' relações de cordialidade com os conselhos executivos e que, de certa forma, assumem uma posição subalterna. 'A intervenção das associações de pais nas escolas é mais consentida do que reconhecida.' E sublinha que a escola não deve carregar tudo às costas. 'A escola deve mudar, abrir-se à vida, ter em conta não só a vida, mas também o vivido pelas famílias. Não pode ter a presunção de fazer tudo sozinha.'

'O que os pais verdadeiramente querem não é mais espaço para intervir, mas sim serem reconhecidos pela escola no seu papel diário. E é este reconhecimento que faz falta. É preciso que os pais venham para a escola, que a assumam como um projecto seu.' Fernando Lima adianta ainda que a participação dos pais nos conselhos pedagógicos ou nas assembleias de escolas já não é suficiente, por não assegurar uma informação em tempo útil e decisiva na vida escolar. 'Parece-nos que o movimento associativo quer mais pertencer à administração do que à gestão propriamente dita. Ou seja, quando os pais dizem que querem ser melhor e mais informados em tempo útil, significa que não se importam de não fazer parte da gestão, mas que devem, de alguma forma, poder influenciar as medidas de gestão que se tomam nas escolas', explica.

'Apesar de quererem participar na gestão das escolas, os pais também conseguem delimitar bem os sectores de trabalho. Reconhecem que há espaços exclusivos dos professores onde não devem entrar.' O professor de História encontrou um problema nessa relação entre famílias e escolas: a representatividade. 'O estudo permite verificar que existe uma pouquíssima participação dos pais no próprio movimento associativo.' Um défice de participação cívica generalizado a outros contextos da vida e dificuldades de mobilização ajudam a explicar essa realidade. 'As associações de pais tendem a assumir um papel supletivo, secundário, na vida das escolas, a contrastar com uma certa cordialidade entre as chefias das associações de pais e as direcções das escolas.' 'É uma participação mitigada que, de facto, reduz o papel dos pais nas escolas a um papel de colaboradores subordinados', acrescenta o docente.

Fernando Lima encontrou uma relação 'funalizada'. 'O movimento é voluntário e heterogéneo, mas as relações entre a escola e o movimento realizam-se praticamente entre o presidente da associação de pais e o presidente do conselho executivo. E esta funalização acaba por fragilizar e vulnerabilizar o movimento e contribuir para a subalternização da associação em relação à escola.' 'Reduz a uma relação ‘clientelar', delimita o pouco peso político que a associação de pais tem em relação à construção dos projectos. A relação constrói-se mais em função de afirmações personalizadas do que em funções de vínculos institucionais - e quando é assim quem sai a perder são, de facto, os pais', reforça.

Fernando Lima quis perceber as fragilidades, limitações e potencialidades do movimento associativo de pais. 'Sempre me fez alguma confusão a falta de envolvimento das famílias na escola. É comum dizer-se que os pais vão com os filhos a todo o lado. E porque não vão à escola? Do lado da escola, também é comum atribuir esta falta de participação das famílias no processo educativo ao desinteresse, à indiferença e ao alheamento.' Daí a vontade de debruçar-se sobre as virtualidades e os obstáculos que rodeiam a intervenção das associações. Na sua opinião, a complementaridade continua a ser a palavra mais importante na educação. 'A escola e os pais têm de perceber isto. É preciso que a escola se abra aos pais e que os pais percebam que a escola tem de ser um projecto seu.'

O professor de História optou por uma metodologia mista. Enviou um primeiro questionário às 162 associações de pais dos centros de área educativa do Porto e de Entre Douro e Vouga - que abrange os concelhos de Santa Maria da Feira, São João da Madeira, Oliveira de Azeméis, Vale de Cambra e Arouca. Uma abordagem regional, de contextos diferentes e complementares. Recebeu 37 respostas. E fez seis entrevistas a presidentes de associações de pais, incluindo aos da Escola da Ponte e Escola de S. Gens. A metodologia inclui ainda uma entrevista ao presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais.